sexta-feira, 30 de maio de 2008

Avó

A dona Maria do Carmo
e seus ares comandantes
marcaram meus passos infantes.
Em nada era ïnha¨...
Grande senhora feudal,
sem feudo ou cabedal.
Mas senhora, ora, ora...
Tinha sempre o mesmo visual,
tinha estilo, caráter e provérbios,
a grande senhora feudal.
Firmeza nas passadas,
carinhos furtivos,
cuidados e mimos,
inesperados, inexprimíveis,
imprevisíveis.
Tirana doméstica, ao pé do fogão.
Sonhos, de verdade, saídos das mãos,
(na hora do lanche).
Sonhos fresquinhos, feitos na hora,
sem demora,
para nosso deleite e apetite.
Para o bolo xadrez, uma reguinha,
pequenininha, milimétrica,
instrumento da busca à perfeição.
- Cadê minha regua?
nunca uma trégua
ao próprio querer,
(se é que o tinha)...
Autoritária, como podia ser
uma pessoa ignorante,
que mal sabia ler ou escrever,
ter tal poder?
Arbitrária, amava estes
mais que aqueles netos
(pena que não os netos certos).
Amava os problemáticos, descontentes.
(Talvez os adivinhasse mais carentes)...
Alguns diziam: - Como sofre, esta criatura.
Não sabiam de sua têmpera: Dura.
Sua alva figura...
Os olhos indecisos,
entre o verde ou amarelo,
o cabelo, farto, belo.
Xerifando nossa vida,
regulando asmas, namoros, e saídas.
Ah! Dona Maria do Carmo,
enviuvou e esqueceu da vida.
Xaropadas para os rins,
cataplasmas de linhaça,
banho frio, banho quente,
sinapismos para os brõnquios,
medicina, só caseira.
Avó recatada, filha ansiosa,
neta descasada, bisneta nervosa.
Mulher de antigamente:
monumento à decência,
língua afiada, chás para tudo,
bolsinha de dinheiro miúdo,
missa aos domingos,
cartomantes para as dúvidas,
aversão às dívidas,
gavetas impecáveis,
imperatrizes domésticas,
com medo de barata.
Choravam sozinhas, discretamente,
a lembrar dos maridos ausentes.
A Dona Maria do Carmo
jaz na minha saudade,
guardada no meu coração,
(às vezes sem direção)...

0 comentários: